Dia 90
Lembro da primeira vez que alcancei essa marca. Eu estava radiante, contando os dias. Tomei um café especial no dia, almocei fora e comprei uma guitarra e um amplificador como presente merecido. Eu suspirava de alegria e me sentia outra pessoa.
Hoje, está sendo mais um dia como outro qualquer. Me arrastei pra sair da cama pela manhã, comi dois pedaços de pizza amanhecidos, tive vontade de chorar no trabalho mas segurei a onda. Almocei uma comida simples e meio sem graça que fiz pra semana (arroz, frango e abóbora), admirei o temporal que caiu pela tarde, cheguei em casa, abracei minha gata e pedi uma comida japa pra comemorar novamente essa marca.
Mas a real é que quando você está de luto, a vida fica cinza, uns dias com tons mais escuros e outros um poucos mais claros.
Acho que o amor as vezes é egoísta. Meu pai sofreu por 4 meses e nesse período eu orava pra que Deus o levasse e acabasse com sua dor, mas hoje, na ausência, eu queria pegar o carro e ir vista-lo na clinica onde estava internado, mesmo que fosse para o ver naquela cama hospitalar, falando pouco comigo com muita dificuldade e orando por mim na hora que eu fosse embora.
Enquanto ele estava vivo, eu tinha um propósito que era cuidar dele, aproveitar seus últimos momentos, então eu tirava forças pra continuar em meio a toda aquela correria de trabalhar, cuidar da casa e ir visita-lo.
Hoje parece que sigo em frente sem um propósito, sem rumo. Levanto de manhã porque tenho que levantar. Os dias são iguais e os finais de semana que antes eram prazerosos, agora são solitários e apáticos.
Sim, tenho dias bons, mas eles são como respiros breves de alguém que está submerso em um mar de angústia. Eu abraço a dor e me permito sofrer porque a força não está na ausência de sofrimento, mas na Resiliencia de continuar mesmo em meio a dor.